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A Lei da Palmada chegou. E agora, o que fazer?


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Adriana Araújo: Começamos mais um Programa Diário Semanal. São exatamente 10 horas da manhã, trataremos um tema imperdível, sobre a Lei da Palmada. Estamos na Rádio Itacaiúnas AM 850 kHz. Inicio fazendo um registro especial sobre uma pessoa, um homem que me deu a oportunidade de realizar esse programa, de modo independente e que vem abrindo suas portas ano após ano com muito amor e respeito. Dedico esse programa ao Senhor Demétrius Ribeiro que fez aniversário nesta sexta-feira e está ficando cada vez mais sábio, maduro e inteligente. Quero dizer que conheci o Demétrius há muito tempo atrás como um homem batalhador, lutador e que conseguiu vencer na vida e se tornou um homem muito respeitado em Marabá, na Região e em todo o Estado do Pará. Parabéns Demétrius, e digo que Deus está contigo.

Mando um alô muito especial às pessoas da Zona Rural de Marabá e de cidade vizinhas e tenho certeza que o debate de hoje vai contribuir para melhorar a vida e a educação de muitas pessoas. Agora abro espaço para uma reflexão.

Mensagem do Dia:

Crescer é tão desafiante quanto nascer.

Para educar num mundo repleto de influências, é necessário delimitar espaço, definir papéis e não abrir mão de itens fundamentais – educação moral e religiosa, escolarização, entre outros, tão indispensáveis que, há milênios, o maior de todos os livros já alertava: “Ensinai à criança o caminho em que ela deve andar, e, mesmo depois de velha, ela não desviará dele” (Prov. 22:6).

Mas até onde os pais podem atender às exigências, às imposições e aos desejos da criança? Como impor limites num ser ainda imaturo sem causar danos psicológicos ou emocionais?

Formar a personalidade é um desafio. Uma dúvida inquieta especialistas e ecoa a todo instante na cabeça dos pais: Como impor limites aos filhos?

Determinar limites na fase da formação da personalidade é fundamental para ostentar um relacionamento estável e proporcionar a formação do indivíduo que passa a refletir sobre seus valores, direitos e obrigações no seio da família e, posteriormente, na sociedade.

Segundo o jornalista e historiador André Fontaine, “todo adulto é, basicamente, o resultado direto dos limites que recebeu quando criança, de como eles foram colocados, entendidos e aceitos”. A falta de limites na infância colabora para existência de jovens rebeldes e adultos desorganizados emocionalmente. O excesso de liberdade poderá comprometer o relacionamento entre pais e filhos, pelo não reconhecimento das linhas demarcatórias.

Mas até onde os filhos são dos pais ou do mundo?

O equívoco maior é criar os filhos para si, e não para o mundo. Poucos estão preparados para uma separação. O rompimento do cordão umbilical é um curso natural. Eles crescem, exigem o seu espaço e vão buscar sua independência. Cabe aos pais prepará-los para encararem os desafios de um mundo que exige a formação da personalidade, do caráter e o conhecimento das regras de convivência. Ética, respeito e limites são valores gerados no seio da família. A escola vai apenas moldá-los e amadurecê-los.

O primeiro passo é saber dizer “não”, para que a criança não cresça acreditando que pode tudo. A consciência de que sempre existirá algo para conquistar, um motivo para atingir objetivos e propósitos através de seus valores que devem ser cultivada. Nessa trajetória, as regras são impostas pelo próprio meio e uma das normas invioláveis é respeitar limites, principalmente os do semelhante.

A psicóloga Tania Zagury acredita que “limite é dizer sim sempre que possível e dizer não quando necessário” e mais: “limite é saber conviver com a frustração e adiar satisfações”. Não devemos ter medo de “frustrar” nosso filho. O mundo será impiedoso em frustrá-los, portanto, é imprescindível prepará-los, fornecer-lhes ferramentas. No conflito entre disciplina e limite, na dúvida entre o “sim” e o “não”, pais se desesperam por terem permitido que os seus filhos fizessem o que queriam, simplesmente por serem crianças.

Constância e persistência são palavras de ouro na experiência de estabelecer e consolidar limites.

Pais devem ser a âncora, a rota, a voz e o silêncio. A âncora que ampara, proporciona segurança, estaciona num porto seguro; a rota que conduz ao crescimento humano e pessoal através da experiência; a voz para falar – não para conter, mas para indicar o caminho; e o silêncio para ouvir os medos, captar as fraquezas, entender as inseguranças e as necessidades de uma criança que necessita de gestos de carinho, palavras de incentivo, atitudes corretivas e calor humano para formar o elo de afeto. Afinal, crescer é tão desafiante quanto nascer.

Adriana Araújo: Iniciando os trabalhos com os convidados postados à mesa, vamos ao bom dia de nossos ilustres debatedores.

Dr. Plínio Pinheiro (Advogado e Juiz do Tribunal de Ética da OAB): Bom dia Adriana. Eu fico feliz de puder participar mais uma vez desse seu programa semanal, tão instrutivo e que alcança e ajuda muita gente a dissipar dúvidas, a encontrar caminhos que muitos não encontrariam por si só.

Dr. Odilon Vieira (Advogado): Bom dia Adriana Araújo. Bom dia ouvintes da Rádio Itacaiúnas. Mais uma oportunidade de tentar ajudar às pessoas a elucidar mais um tema de muita importância para a sociedade.

Dra. Alexssandra Mardegan (Promotora de Justiça): Bom dia Adriana. Bom dia a todos os ouvintes. É com alegria que retorno novamente à esse programa, com a finalidade de contribuir de algum modo para a sociedade quanto a um assunto polêmico que vamos debater no dia de hoje.

Dra. Patrícia Montagna (Psicóloga): Bom dia. Bom dia para todos os ouvintes. Também estou muito feliz em poder contribuir com algo que acontece com todas as famílias. O assunto de hoje vai ser realmente bastante esclarecido.

Conselheiro Marconi Guimaraes (Conselheiro Tutelar): Bom dia Adriana Araújo e todos os ouvintes da Rádio Itacaiúnas, do Diário Semanal. Também agradeço por essa oportunidade e participar de uma mesa recheada com o objetivo de beneficiar com os esclarecimentos os ouvintes em relação à uma lei recentemente aprovada.

Conselheira Maria Neuza (Conselheiro Tutelar): Bom dia. Quero agradecer novamente pelo convite. Estamos aqui com o objetivo de contribuir com o nosso conhecimento e aprender um pouco mais sobre esse tema que ainda é novo e polêmico.

Dr. José Erickson (Defensoria Pública): Eu agradeço o convite de estar aqui novamente em nome da Defensoria Pública fica aqui os meus cumprimentos à você pelo trabalho, a todos os ouvintes e aos membros da mesa que contribuirão com o debate pra aumentar o conhecimento da população sobre a Lei da Palmada.

Dra. Cláudia Chini (Advogada OAB/PA): Bom dia Adriana. Bom dia todos os ouvintes e colegas de mesa. É um prazer muito grande representar a OAB justamente para abordar sobre um tema que causou tanta celeuma e confusão quanto à sua interpretação, que é a Lei da Palmada. Muitas questões distorcidas serão interpretadas para o conhecimento da nossa sociedade, das nossas famílias. Parabéns Adriana Araújo pela propositura.

Em debate a Lei da Palmada

A imprensa brasileira vem dando enfoque especial ao Projeto de Lei 7.672/2010, denominado de Lei da Palmada ou Lei Menino Bernardo, aprovado na Câmara dos Deputados em 21 de maio de 2014 e no Senado Federal em 04 de junho do mesmo ano, dando outras atribuições aos Conselhos Tutelares.

Consultada, a população vem opinando sobre esta decisão, já aprovada no Congresso Nacional e que já recebeu a sanção da Presidenta Dilma Rousseff.

A Lei da Palmada define Castigo Físico como: Ação disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física que resulte em sofrimento físico ou lesão.

Entre as medidas previstas de punição de 1 a 4 anos de prisão aos pais, também consta o encaminhamento a programa de proteção a família ou de orientação, com tratamento psicológico ou psiquiátrico. Em alguns casos a criança deverá ser encaminhada para tratamento especializado.

A Lei obriga médicos e assistentes sociais a fazerem as denúncias às autoridades dos casos de agressões e, se ocorrer a omissão da denúncia, estes poderão pagar multas que variam de 3 à 20 salários mínimos, ou seja, de 2 mil até 14 mil e 500 reais.

Para o cumprimento da Lei o governo vai ter que investir também em campanhas educativas, treinamento de mediadores de conflitos, capacitação de educadores, dos profissionais da saúde e assistentes sociais objetivando a prevenção e combate da violência doméstica.

Adriana Araújo: Vamos ao debate. A aprovação desta Lei não se caracteriza como uma intromissão nas relações familiares, de responsabilidade dos verdadeiros pais das crianças que, detêm o controle sobre como educar o seu filho? O Estado agora está querendo cuidar das famílias brasileiras?

Dr. José Erickson (Defensor Público): Tudo que vem pra reforçar o papel de cada um é importante. Quem tem que cuidar da educação das crianças é a família. O Estado tem que fortalecer a família, os mecanismos e as instituições. O que o Estado não pode oferecer é o braço repressor e atuar aonde não deve. No direito penal nós temos os princípios da subsidiariedade, ou seja, só deve se portar e criminalizar condutas onde outros ramos do direito foram ineficientes, antes da postura repressora tem que haver a postura de fortalecimento do papel que cabe à educação da criança e da família. Neste aspecto o que a gente percebe é a intenção de fortalecer a família, logicamente, identificando o que é abuso, maus tratos. No ponto em que já ultrapasse esse nível de modificação de papeis, cabe à família o papel de educar. Em minha opinião o Estado ultrapassa seu papel quando quer interferir em relações que não lhe cabe, pois, cabe à família. O estado só deve atuar em caráter subsidiário, inclusive, recorrendo a meios mais extremos em último caso.

Dra. Alexssandra Mardegan (Promotora Pública): Comungo do mesmo entendimento do Dr. Erickson. Esta é uma realidade que tem de ser levada à sério. É impressionante que muitas famílias já introjetaram essa intromissão do Estado na educação dos seus filhos. Vou dar um exemplo. Não é incomum os pais, às vezes, quando não dão conta de conduzir a educação dos filhos em casa ameaçam os filhos e até chegam a leva-los ao Conselho Tutelar. Chegam dizendo que trouxe os meninos para darem um jeito neles e que já não aguenta mais.

Eu já recebi na Promotoria pais na situação acima. E digo, alto lá, o filho é seu. O papel de educar é do pai, da mãe ou outra pessoa responsável. Eu tenho os meus filhos para educa-los.

Eu vejo com preocupação. Creio que essa é uma interferência do Estado, apesar de ser obrigação de todos, de por a salvo, resguardar os direitos da criança, por a salvo de toda a forma de violência ou negligência. Mas, isto não significa que o Estado vai interferir diretamente. O que tem de ser feito é criar mecanismos de políticas públicas que verdadeiramente efetivem estes direitos das crianças e dos adolescentes. A gente percebe que a manifestação dessa violência, na verdade, já é decorrente de um problema de vulnerabilidade que começou lá atrás, cujo fator foi a falta de políticas públicas, foi e continua sendo e esse é o maior problema que a gente enfrenta na tentativa de resguardar os direitos das crianças e dos adolescentes, políticas públicas. Pro Estado é muito fácil criar leis e mais leis, e efetivar? Com isso ninguém se preocupa. Mais do que novas leis, é preciso criar mecanismos que propiciem a efetivação destes direitos. Isto passa indiscutivelmente por políticas públicas verdadeiramente aplicadas.

Conselheira Neusa (Conselheiro Tutelar): com base no que a Doutora colocou agora, a lei vem pra auxiliar a gente. De certa forma ela deixa essa lacuna, precisa ser aplicada, cumprida, mas, de que forma a gente vai cumprir isso? Hoje eu vejo como um grande entrave pro Conselho Tutelar fazer isso. Eu preciso da Assistência Social, do serviço do psicólogo, do serviço de uma Delegacia Especializada e eu tenho a Lei no papel e ela diz o que eu tenho que fazer. Mas, esse mecanismo pra efetivar esse direito, pra ele de fato ser garantido eu não tenho ainda.

Dra. Cláudia Chini (Advogada OAB): De início reagi a questão da intervenção estatal no poder familiar. Mas, aprofundei-me nos outros temas, do abuso infantil, do abuso sexual, da violência doméstica, principalmente contra a mulher, fui observando que na realidade essa lei vem como uma função pedagógica, de trazer o reflexo que a nossa constituição federal nos outorgou, inclusive, vou ler um artigo, que passou a reger as relações familiares e esses, principalmente é uma customização (acho que foi isso que a Dra. Cláudia quis dizer) desses direitos que nós temos no Código Civil, na Constituição Federal, uma forma de divulgar pra sociedade do que são essas obrigações e direitos dos pais, dos filhos, de uma forma mais abrangente.

A Constituição Federal prevê e, quando diz que o Estado está interferindo, na realidade, o artigo 227 impõe à família, à sociedade, ao Estado a proteção à criança.

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Artigo 227 da Constituição Federal

Os direitos das crianças devem ser respeitados de imediato, por quem? Pela célula mater, a familiar, assegurados pela sociedade e pelo Estado. Nós temos direitos aos deveres dos pais no nosso Código Civil que incluiu desde 2002 no artigo 1.634 que diz:

“Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores, dirigir-lhes a criação e educação; tê-los em sua companhia e guarda; conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.”

Artigo 1.634 do Código Civil Brasileiro

Então você observa que existe toda essa obrigação dos pais e a lei em si, ela não impede essa questão da correção, especificamente ela não diz que você não pode dar uma palmada no seu filho. É clara quando trata da questão da agressão física que é completamente diferente e tem previsão legal. E, inclusive, quero chamar a atenção, é a falta de esclarecimentos que está confundindo a cabeça das pessoas. O artigo 1638 do Código Civil deixa clara a perda do poder familiar nos casos como:

“Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: castigar imoderadamente o filho; deixar o filho em abandono; praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.”

Artigo 1.638 do Código Civil Brasileiro

Quando eu digo que esta Lei vem como um reflexo da customização dos princípios que regem a nossa família e diante de tudo que a realidade tem mostrado no seio familiar e, que precisa ser revisto, há uma verdadeira necessidade de todos, do conjunto da sociedade, o Estado está intervindo porque está sendo importante como no caso da Lei Maria da Penha, da impossibilidade de conter a violência doméstica. Agora entra o Estado para abordar até onde que entra esse poder de correção, fazer o equilíbrio, fazer com que os pais, os responsáveis legais ponderem sobre o que é castigo físico, se há necessidade, se precisa levar uma palmada, uma correção, de repensar a sua postura na educação dos filhos.

A mídia tem um lado maravilhoso como é o caso do Diário Semanal com estes esclarecimentos e conscientização, mas, existe o lado que procura causar celeumas, de provocar e de cutucar, de distorcer e ver o circo pegar fogo.

Adriana Araújo: Podemos admitir como correto, perante esta lei o seguinte comportamento: Vejo que meu filho está fazendo algo de errado, tipo de não querer tomar banho diariamente, devo tentar resolver na conversa, uma vez, duas, três vezes. Se não resolveu, significa que não posso adverti-lo ou dá-lhe uma palmadinha como medida disciplinadora. Então, devo procurar o Conselho Tutelar e pedir para que resolva esta confusão?

Dr. Odilon Vieira (Advogado): Então querido ouvinte. A Lei não criou tipo penal incriminador. Não criou conduta penalmente punível. Lesionar alguém já faz parte do Código Penal na rubrica maus tratos. Torturar alguém, já existe uma lei que trata da tortura. A Lei não criou condutas típicas do ponto de vista penal, então, a meu ver o pai pode sim, continuar corrigindo de forma moderada, de forma leve. A imprensa realmente colocou mal o assunto. A palmada pode ser dada, desde que não venha causar uma lesão, ou seja, não é porque o filho não quer tomar banho que o pai vai quebrar o nariz dele, se fizer isso ele vai ser preso. Se for uma palmada, conversando agora a pouco, citando o Velho Dalmásio de Jesus, existe uma coisa chamada de exercício regular de direito. Se dois boxeadores estão brigando no ringue, então, os dois por brigarem vão ser presos? Não. Os dois estão sobre o excludente de ilicitude, do exercício regular de direito, então, acho que a palmada pode sim. Seria um absurdo um filho não tomar banho e acionarmos o Estado para que convença ou que dê banho no meu filho.

Adriana Araújo: Uma imagem como essa, do banner que ganhei de um patrocinador, da Requinte Store e da Corpo e Seda, nós tiramos a fala da figura. Isto acontece na vida real, ou seja, uma criança em uma grande loja vê um tablete e abre o maior berreiro, faz o maior escândalo para a mãe comprar o objeto, percebe-se que pela fisionomia da mãe ela não está querendo comprar e, observe que a vendedora estende o braço ao garoto como se quisesse puxá-lo e com a outra mão indica, mostra o objeto e diz, a senhora deve comprar ou as pessoas vão pensar que a senhora bateu nesta criança.

Eu apanhei, minha avó me dava palmadas, apanhei de cinta e tudo isso não foi para o meu mal, foi porque realmente eu aprontava e merecia ser corrigida e naquele tempo era assim que as pessoas agiam com os filhos danados. Eu não tenho nada para reclamar daquele tempo.

Dra. Patrícia Montagna (Psicóloga): O assunto é muito polêmico e aos poucos vamos elucidando as coisas. Tudo na vida é uma questão de informação. A informação trouxe as grandes guerras e as grandes pacificações da nossa história. A Lei, como tudo é muito contraditória na vida. O nome, eu acho que esse nome de Lei da Palmada começa errado e isso gera uma polêmica, gera confusão pras pessoas que tem pouco acesso a esse tipo de informação. Nós sabemos que a mídia traz muita coisa boa, contudo, a gente só passa aquilo que vai gerar algum conflito pro outro ou para provocar o outro, tipo: olha mãe, a Lei da Palmada agora você não vai poder bater mais. Então, eu acho que essa não deve ser a discussão. A discussão é sobre a questão da relação interpessoal. Culturalmente temos muita dificuldade até de ler, não gostamos de ler e quando se fala em Código Penal, Código Civil, em Constituição Federal, em Estatuto da Criança e do Adolescente quem é que tem acesso? Qualquer um pode baixar com o celular e ter acesso. Toda lei é passível de interpretação. Eu acho que foi feita uma má interpretação.

A lei levou a homenagem ao Menino Bernardo que veio a falecer e, independente disso, levou a condenação daqueles pais e foi o caso de um assassinato. Agora a questão é, pensando nisso, acho que foi bem colocado o nome de Menino Bernardo, em pensar que a lei é pra esse tipo de extremo. Tudo que está no extremo não é positivo pra vida. A nossa saúde depende da busca do equilíbrio e o comportamento, a educação, as relações interpessoais perpassam pela busca do equilíbrio, de eu pensar sobre o que é melhor para meu filho. A pergunta a ser feita é, que tipo de família eu quero ter? Que tipo de indivíduo eu quero para a sociedade? Os pais criam os filhos para si, por uns tempos, contudo, esse filho vai pertencer a sociedade. Todos os estudiosos e pesquisas em torno do comportamento do ser humano demonstra que bater só gera violência. Eu lembro do verso: gentileza gera gentileza. Amor gera amor. Se eu bato o que eu estou ensinando? E eu sei que é uma questão muito complexa de entender, tem polêmicas demais. Os pais mais antigos e a nossa educação perpassou por outra teoria. Nós vivemos em outro mundo que foi evoluindo. A questão maior é, o que serve para mim, às vezes não vai servir pra você.

Eu apanhei como você Adriana falou, no entanto, os estudos mostram que bater não educa. Costumo nas minhas palestras de orientação aos pais, dizer, você já percebeu que antigamente a gente tinha medo, todo mundo conta vantagem e diz assim, nossa educação, no meu tempo era só no olhar. Só no olhar e, se o meu pai, a minha mãe ou a minha vó desse aquele olhar eu já sabia o que ela estava dizendo. Será que era de respeito ou era de medo aquele olhar? Porque para o comportamento isso não é respeito, é medo de algo que vai acontecer. A criança nem podia passar no meio dos pais quando estes estavam conversando. E eu acho que bater só gera violência e não educa.

Uma pesquisa indicou que dois terços do cérebro é visual motor, eu enxergo e me movimento, o resto que sobrou, um terço, é para outras funções cerebrais, enfim, se dois terços sou visual e motor, quando eu vejo uma cena de agressão, seja ela qual for, a criança está aprendendo mais do que escutando, do que fazendo porque outra coisa. Ela recebe essa violência e vai repetir essa violência na escola, com os colegas e com a sociedade em geral.

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Adriana Araújo: De volta Ao programa. Percebe-se uma confusão nesta lei entre maus tratos com disciplina, sobre o que é agressão e o que é disciplina. Uma situação colocada é a seguinte: se um pai tira um filho desobediente do computador e puxa-o pela orelha e esta fica inchada, vai à delegacia e faz um boletim de ocorrência e a polícia vai fazer uma grande investigação, chama-se o conselho tutelar, assistentes sociais, médicos, enfermeiras e psicólogas para tentarem incriminar este pai. O que podemos esperar de nossas delegacias, dos nossos investigadores e como ficará a imagem de um pai ou de uma mãe após o episódio?

Dr. Plínio Pinheiro (Advogado OAB): Realmente esse tema é complexo e polêmico. Particularmente eu tenho uma dificuldade enorme pra lidar com isso, por eu não ter sido um praticante dos rigores físicos contra meus filhos. Vou recordar um episódio da infância da minha filha. Um dia eu estava assistindo televisão e minha filha Gabriela tinha 5 anos e ela fez alguma coisa na cozinha e ouvi quando a empregada disse: vou falar para o teu pai pra te bater. E a Gabriela com a vozinha fina e esganiçada falou: Fique você sabendo que o meu pai nunca me bateu. E hoje ela é mãe e jamais bateu na minha netinha.

O Brasil é um país de uma hemorragia legislativa impressionante. Se faz leis pra tudo nesse pais, mesmo quando já existem leis. Temos uma superposição de leis e o nosso legislativo faz leis para não serem cumpridas, porque existe uma estrutura toda para que a lei seja cumprida e, foi isso, que os Conselheiros Tutelares falaram. Remetem a eles um problema e não lhes dão condições de resolver isso. Falávamos agora há pouco, eu e a Doutora Alexssandra exatamente sobre essa evolução da ação física da criança, moderada, rigorosa e etc. e isso vai acabar sobrando para o juiz decidir se ela foi branda se foi rigorosa ou não. Até chegar nesta decisão, com a celeridade que nós sabemos que, infelizmente o nosso legislativo, o nosso judiciário não tem, pela falta de estrutura, principalmente, muita coisa já aconteceu ao longo desta viagem. Mas, essa lei 13.010 de 26/06/2014 que foi chamada de Lei da Palmada e que, depois foi radicalizada dando o nome do garoto Bernardo, pra uma situação, falávamos também, que ela não prevê, que foi o caso extremo do assassinato da criança. Isso já vem ao longo do tempo, começou com a Declaração dos Direitos da Criança em 1959, que no segundo princípio diz:

A criança tem o direito de ser compreendida e protegida, e devem ter oportunidades para seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, de forma sadia e normal e em condições de liberdade e dignidade. As leis devem levar em conta os melhores interesses da criança.

Segundo Princípio da Declaração dos Direitos da Criança, 1959

Em 02 de setembro de 1990 foi formalizada a Convenção sobre os Direitos da Criança pela UNICEF e o Brasil, imediatamente, em 21 de novembro de 1990, ou seja, 19 dias depois já havia promulgado a Convenção dos Direitos da Criança através do Decreto 99.710. então, pelo tempo que este assunto está viajando, analisado no mundo todo, a nossa lei deveria ter sido mais objetiva, mais ampla e tudo mais. Mas, infelizmente não. A Suécia foi o primeiro país, isto em 1979 a inserir no seu Código Penal, dispositivos sobre esta matéria e, pelo tempo que demanda de lá para cá, já teve tempo de analisar os benefícios e os prejuízos. Há uma discussão muito grande, acham que há mais prejuízos na formação das crianças por este tipo de ingerência do Estado no seio familiar.

Parece que chegou a um ponto que eu não posso fazer mais nada, vou atrás do Conselho Tutelar, vou atrás de quem pode me ajudar. Será que, quem a lei diz que vai me ajudar está em condições de me socorrer ou o problema vai ficar ainda pior? Por que eu não posso fazer nada e os outros também não e, quem fará?

Conselheiro Marconi Guimarães (Conselho Tutelar): Voltando a questão sobre o que podemos esperar de nossas delegacias, dos nossos investigadores e como ficará a imagem de um pai ou de uma mãe após o episódio? Também foi colocado o exemplo de um filho desobediente que tem que ser puxado do computador e dá-se um puxãozinho de orelha e esta fica inchada. Neste caso percebe-se que ocorreu uma lesão e, queremos que o delegado venha apurar o fato pra responsabilizar quem o lesionou. O defensor dos direitos da criança e do adolescente quer ver o caso apurado e, responsabilizar quem de fato fez isso.

Eu também não gosto do termo “Lei da Palmada”, batizado assim pela imprensa. Mas, com relação a agressão à criança, recebemos muitas denúncias e temos recomendação do Ministério Público, ocorrendo ou não uma lesão, temos que ouvir a pessoa citada na denúncia, tendo como vítima a criança.

A gente não vê na pedagogia uma recomendação em que o castigo físico é uma coisa que ajuda na educação de um filho. E, então, quando ocorre a denúncia a gente tem que ir e se posicionar no lugar da criança. É a autoridade policial que vai apurar se ocorreu ou não. Também, não é pelo fato de ser denunciado ao Conselho Tutelar que o pai ou mãe vai ser penalizado. Se não tiver nada, não vai se fazer nada.

Adriana Araújo: A Lei da Palmada foi aprovada no Senado Federal considera o pai ou mãe que derem umas palmadinhas nos filhos, tão criminosos como quanto um pedófilo, assassino ou estuprador. Tudo isto pode ser compreendido como uma política de governo ou como algo excessivo e anormal?

Dr. Odilon Vieira (Advogado): Eu vou reiterar novamente o que já disse anteriormente. A Lei da Palmada não criou nenhum crime novo, então, não tem nada a ver a correção de atitude dentro do exercício regular de direito do pai e da mãe, com outros delitos que já existem em nossa Legislação Penal. Não confunda senhor pai, o senhor pode sim corrigir. A questão do puxão de orelha eu entendo que o pai pode. Agora, se o pai chegar a quebrar o nariz, quebrar o braço, estará cometendo um crime.

Eu estava lendo o nosso Código Processual Penal e quem inicialmente tem competência para entender se houve ou não o delito é o delegado de polícia. Se a criança chegar efetivamente lesionada na delegacia, possivelmente o delegado vai querer instaurar o auto de prisão em flagrante. Mas, se chegar sem nenhuma lesão dizendo que teve a orelha puxada, não acredito que o delegado vá movimentar a polícia do judiciário para efetuar a prisão em flagrante. Continuo dizendo que acho que os pais podem continuar corrigindo os filhos com moderação, não lesionar, não pode maltratar, não pode torturar.

Dr. José Erickson (Defensor Público): Olha Adriana, pode dar uma palmada? Pode. Mas, o Conselho Tutelar aqui do meu lado já disse se der uma palmada vai apurar. A minha preocupação é com a interpretação e também com a aplicação.

Os seus ouvintes são pessoas humildes, foi muito importante o que disse a Dra. Patrícia, de que é necessário avaliar se a palmada é pertinente ou não. Só que pras famílias que tem condição, acesso a esse tipo de conhecimento. Essa lei toca muito nas famílias que não tem acesso a informação, famílias pobres que muitas das vezes não pensam se pode ou não bater no filho. Eu entendo em gênero, número e grau o que comentou o Dr. Odilon. A lei não criminaliza, esta ou a lei anterior, dar uma palmada. É preciso atentar pra finalidade. Se existe penalidade educativa, então não existe o tipo penal. Quando você está diante de um menor com a orelha inchada, estar diante de um fato objetivo e você não tem como avaliar antes, qual foi o objetivo. Entramos agora no aspecto prático e, infelizmente, na função de defensor a gente observa que até que a parte demandada esclareça o que aconteceu, ela já foi submetida a um procedimento administrativo que seja, mas foi. Isso por si só já é um constrangimento. Esta postura do Conselho Tutelar, eu creio, de encampar esse poder de polícia é uma postura totalmente razoável porque está diante de uma situação de violência e vai apurar. Só que isso acaba fragilizando a postura dos pais.

Gostaria muito que essa lei tivesse o caráter de fortalecer, de fomentar o Estado a ter mais atenção. Volto ao assunto que o Dr. Plínio Pinheiro falou de leis criadas e não efetivas. Eu acho que esta vai ser efetivada pelo que ela tem de negativo, de criar uma espécie de interpretação equivocada e acaba fragilizando as famílias mais vulneráveis. E numa situação como essa de fazer ou não fazer, vão acabar não fazendo, vão acabar saindo da sua postura que se disse que é o papel da educação e esse tipo de discurso acaba fomentando isso. Eu gostaria de dizer, o Estado com essa lei vai auxiliar as famílias vulneráveis a ter mais condições de criar, mas, não é isso que vai acontecer. O que vai acontecer é, se tiver palmada vai ter o procedimento e a pessoa vai ser equiparada a um criminoso e até comprovar que a finalidade é educar, ela já foi submetida a um constrangimento de passar por um procedimento. A interpretação cabe, mas, a minha preocupação é com a aplicação desta lei.

Dra. Cláudia Chini (Advogada OAB): Meu filho uma vez me ligou chorando que haviam machucado o braço dele. Sai do trabalho furiosa querendo derrubar o mundo e ir pra cima. Isto aconteceu com um cunhado do meu ex-marido. Queria ir ao Ministério Público. Ele foi agredir o irmão e na hora o rapaz ainda pediu pra parar e reagiu. Então, para ele parar de machucar o irmão ficou machucado o braço. Alguém mais assistiu, tanto o pequeno como o mais velho viram e me relataram. Vocês já imaginaram se de repente levo às vias de fato? Graças a Deus tive a sabedoria de ouvir e tomei as providências. Quando cheguei em casa deixei claro que nunca mais me importunassem quando eu estivesse trabalhando colocando essas situações de briguinhas.

É muito bom a conversar e dialogar, mas, pra educar filhos não existem fórmulas prontas capaz de dizer o que fazer em cada situação. Eu tenho quatro filhos e tem um que resolvo as coisas simplesmente com uma conversa. Mas, com os demais é diferente e eu fico imaginando essa situação do puxão de orelha, de o garoto ter reagido e esperneado. No meu tempo a minha mãe pra me levar me dava umas duas ou três palmadas e eu dava muito trabalho mesmo e fazia escândalo. Então, eu vejo que vai ter uma preparação das pessoas, dos Conselheiros Tutelares também, pra quando chegar a hora de agir e não é simplesmente lavrar o auto e levar diretamente pra delegacia que lá já tem muitos casos de violência, de abuso ou ao Ministério Público, ao Judiciário que estão assoberbados e vocês também devem estar com muitos casos graves. Não vejam como uma crítica, mas, como uma situação a se pensar pra se ter maior sensibilidade, uma noção exata de cada caso e não suscitar todo um envolvimento de uma delegacia ou de um processo criminal, movimentar o Ministério Público e colocar toda uma família em constrangimento.

Às vezes dizemos que fomos criados assim, de tal modo e sobreviveu a tudo isso. Tem gente que diz, como o Dr. Plínio que levou e nunca deu uma palmada e parece ser uma exceção. Levamos surras e muita gente exterioriza e reproduz o que lhes aconteceu e usam da violência. Mas, enquanto sociedade, devemos lutar para aumentar a consciência desde a sala de aula, com os professores abordando este assunto e que todos possam saber o que é obrigação, o que é dever, o que é direito, o que significa respeito e comportamento. Temos muitos casos de crianças de 4 a 5 anos que não respeitam os pais, gente que até mete a mão na cara dos pais e que precisam de medidas que visem uma maior preparação pra esta realidade.

Dra. Patrícia Montagna (Psicóloga): O assunto está ficando polêmico, quase pegando fogo, deve ter sido o suco de buriti que provocou isso, deu maior energia. A Lei (da palmada) veio para elucidar a questão das campanhas educativas e não para garantir penalidades e isso sempre foi feito pelo judiciário e o ouvinte já entendeu isso. Eu atendo no CRAS e no CREAS e a maioria das pessoas não sabe das políticas públicas, de como é feito entre os entes federativos. Nível federal emite determinada lei, o Estado e o Município também e nós, envolvidos em uma rede de proteção social, pra garantir essa proteção integral da criança. O Conselho Tutelar é a porta de entrada geral. Eu percebo que os Conselhos Tutelares não estão preparados ainda pra determinadas situações e ainda falta infraestrutura, o município não oferece, muitas vezes, as condições necessárias para que o trabalho se feito de forma efetiva.

Você ouvinte, da cidade ou da Zona Rural, além do Conselho Tutelar você pode procurar o CRAS que é a casa das famílias, que é uma política pública para receber todo o tipo de problema ou para evita-los ou, até mesmo para encaminhar para a equipe de referência de atendimento especializado.

O Conselho Tutelar ao receber, é a sua função, é o seu dever de encaminhar a denúncia. Não lhe compete resolver o problema, mas, de encaminhar e solicitar os serviços para essa família desorientada e não vai direto pra delegacia, até porque a delegacia não tem condições de dar esse atendimento, eles não foram suficientemente treinados para esta lei. Então, como disse o Dr. Plínio, as leis estão aí e muitas para não serem cumpridas. E é a população que determina o funcionamento de uma lei, por meio de nossas atitudes com o objetivo de trazer serviços para elas e pra outras pessoas. O Conselho Tutelar não vai resolver o problema para nós, pra essa família, vai dar orientação, indicar possibilidades que ela tem pra seguir. Por exemplo, ser atendida por uma equipe de referência psicossocial. Os psicólogos, assistentes sociais, médicos e, na verdade não se tem receita como disse a Dra. Cláudia Chini, temos indicações, sugestões e orientações de como essa família pode lidar melhor, não é ensinar: “não bata, não faça isso, não faça aquilo.” Nós colocamos primeiramente essa família pra refletir e através da reflexão que os comportamentos podem ser mudados ou não.

As famílias precisam ser empoderadas através das campanhas educativas, através dos acessos às políticas públicas existentes, contudo, a família ainda demonstra resistência em ir a um CRAS ou a um CREAS, com medo de ser chamado à atenção.

Nós temos muitas maneiras de disciplinar. Toda semana eu dou palestras pra comunidade onde trabalho com atendimento e explico sobre todas as questões de violações dos direitos das crianças e dos adolescentes em geral, os pais precisam de esclarecimentos, essa é a questão. Não é bater ou não bater que vai resolver. É a autoeducação familiar que está precisando, todos nós precisamos e os ouvintes precisam saber que tem locais para recorrer, o Conselho Tutelar, o CRAS, o CREAS, a Secretaria de Assistência Social que tem vários programas. Se no seu município, se na região onde você mora, querido ouvinte, não existe? Procure, busque soluções, porque todas as prefeituras e todos os entes tem orçamento para isso a criança e o adolescente goza do princípio da prioridade absoluta.

Não é delegado, não é juiz que vai cuidar da educação do seu filho não. É o dia-a-dia, a construção, é a convivência que faz a diferença. Não dá para fechar os olhinhos para o caso do Menino Bernardo, acham um absurdo terem colocado o nome na lei, eu acho que a lei vem pra explicitar isso, casos absurdos de violência. Existem muitos casos absurdos como acorrentar uma criança que tem uma deficiência mental e ainda deixam sem alimentação dentro de um quarto. E isso ocorre na região de Marabá e isso é um grande absurdo. É um absurdo você pegar um pau e bater na cabeça do seu filho porque ele não está entendendo. Agora dar uma chacoalhada é outra situação muito diferente. Colocar num cantinho pra pensar, de castigo e sem se levantar é outro caso.

Essa história de filho bater na cara do pai ou da mãe é porque os pais perderam totalmente a noção de respeito, uma criança pequena não pode dominar um adulto. Tem uma turma de psicólogos que dizem não bata e outra, eu digo que bater não educa, tem as pesquisas que dizendo isso, contudo, existe situação e situação. A análise da situação existente, nem sempre o que serve para mim vai servir para você.

Adriana Araújo: Podemos acreditar no bom senso de Conselheiros Tutelares e da Justiça, de decidir sobre a punição ou o castigo aos pais. Como caracterizar legalmente esta lesão ou sofrimento físico? Temos como atender as possíveis vítimas de maus tratos com crianças e adolescentes, na realidade de hoje?

Conselheira Maria Neusa (Conselho Tutelar): Poder, nós podemos qualquer coisa. Em muitos casos e nesses em que há a violência física, uma das coisas que aprendi ao longo de 4 anos, é ter o cuidado para não criminalizar esse pai e essa mãe. Hoje tenho referências de mães que não querem mais as suas filhas em um caso de agressão física e o encaminhamento foi todo feito de modo errado e hoje a mãe faz tratamento e quase ficou louca.

O artigo 136 do Código Penal não faz referência a punição física, mas, do excesso e não se pode exceder nesta disciplina. Os pais quando chegam ao Conselho Tutelar não se sentem bem, chegam nervosos e neste momento procuramos tranquiliza-los, vamos conversar e não somos nós que vamos puni-los, mas, sempre deixando claro sobre o ato praticado e do excesso cometido.

Realmente o Conselho Tutelar precisa de mais estrutura. A gente não trabalha apenas o ECA, fazemos muitas coisas. Tem a lei da Educação, tem o Código Civil, o Código Penal e se efetiva as políticas públicas garantidas por leis a gente não vai dar conta. A gente trabalha nos acolhimentos, quando a gente tira o filho do pai e entrega para a mãe separada ou entrega para uma família substituta e são muitos os casos que chegam.

O Conselho Tutelar não pode tratar de muitas situações como esta Lei da Palmada sem uma maior preparação, uma boa orientação. Nós também não podemos empoderar esse menino ou essa menina, dizer que os pais estão errados. Nós precisamos de uma conscientização maior para tratar de todos os conflitos. É comum, recentemente uma mãe chegou e deixou as três filhas dizendo, “toma eu não quero mais”, bateu a porta e foi embora. Conseguimos leva-la ao Ministério Público e ela fez a mesma coisa.

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Adriana Araújo: De volta ao nosso programa, vamos para o final. Os Conselhos Tutelares do Brasil ainda não possuem as condições ideais de trabalho, principalmente da falta de estruturas, em muitas cidades faltam carros, telefones, o prédio não atende as necessidades, faltam computadores e até papel. Mas, o maior problema talvez seja a demanda. São cinco conselheiros para atender 100 mil habitantes e muitos casos acabam passando sem atendimento. Queremos saber se a atual rede pública de saúde terá condições de atender a demanda que está por vir. A Lei determina que as crianças que sofrerem agressão, deverão receber tratamento especializado. Já temos algum destes Centros Especializados? Quais os profissionais que a rede pública vai poder disponibilizar?

Dra. Alexssandra Mardegan (Promotora): A atual rede pública de saúde não está preparada. A prova disso é que o Ministério Público, odos os dias, a Promotoria de Saúde faz atendimentos, tem que fazer intervenção, temos diversas ações civis públicas contra o município, contra o Estado. É uma briga diária tentando melhorar essas condições de atendimento. Não está, não é suficiente, não é adequada e não dá conta da demanda e isto não é um privilégio apenas de Marabá, infelizmente, este é um problema a nível nacional. Mas, não significa que nós não briguemos pra melhorar dentro do nosso município, dentro do nosso estado.

Com relação a essa demanda criança e do adolescente, dos centros que nós temos continua sendo o CRAS e o CREAS como profissionais especializados como foi dito pela Dra. Patrícia e, certamente, precisa melhorar. Temos um único CREAS e isto é um absurdo, mas, isso é preconizado na legislação e não tem, nem de longe a estrutura mínima que a gente precisa. A nossa luta é para ampliar o quadro de profissionais porque é um trabalho que surte efeito, dá resultado. A gente tem reunido com a rede e os profissionais são empenhados e o resultado é muito positivo.

Com relação à questão anterior, o foco tem sido a criminalização, da conduta dos pais que agridem, mas, uma coisa que a gente não pode perder de foco é o que levou esse pai a praticar tal ato, a chegar a este extremo. Enquanto ficarmos preocupados somente com a criminalização não vai resolver o problema. Nós vamos punir esse pai? Vamos. E, como vamos resolver esse problema? Segrega-lo da família? Privá-lo? Privar a criança e o adolescente? Vamos ter que pensar em trabalhar essa família, reintegrar o núcleo familiar. A criança fica acolhida em um abrigo, mas, não vai ficar lá eternamente e quando completar 18 anos de idade vai ter que deixar o como vai ser a vida dela? Sozinha? Que suporte ela vai ter? Tem que punir se houve excesso. Mas agora, é uma situação que me preocupa. Direito e tudo na vida, sempre digo, é, sobretudo bom senso e bom senso cabe em toda e qualquer situação. Não podemos chegar aos extremismos, podemos educar com amor, com disciplina, com moderação, o que não se pode permitir são os abusos, isso jamais. Nós não podemos deixar de pensar em trabalhar o núcleo familiar, de restabelecer, reunir novamente essa família. O lugar dos filhos é junto dos pais. Nós precisamos, agora, mais do que nunca, com essa expectativa aumentada, fortalecer o oferecimento dos serviços públicos e esse é o nosso maior problema. Na maioria dos casos que nós atendemos, verificamos essa vulnerabilidade e ela veio lá desde o início, essa agressão foi o último ato, o grande desespero daquele pai ou daquela mãe. Precisamos ver a situação como foi muito bem colocada pela Conselheira Neusa. E o suporte? Tem que está preparada e não está e essa é uma luta, uma briga que a gente vai continuar, pra vencer e não tem sido fácil. Culturalmente nesse país é difícil se investir em políticas públicas, seja ela qual for.

Dr. Plínio Pinheiro (Advogado OAB): A Dra. Alexssandra colocou muito bem quanto a desestruturação da rede pública de saúde e também da criação de uma estrutura para reparar o conceito e o núcleo familiar. Nós temos assistido ao longo do tempo uma desestruturação da família. O país compõe-se de famílias e as famílias de gente. Então, é preciso ensinar como lidar com filhos, ensinar a serem pais. O que mais ensina não é o rigor físico, é o exemplo. Os pais precisam dar exemplos pra que no futuro os filhos sejam bons pais também. Mais importante que o artigo que fala da punição, pra mim é o artigo 70-A que diz:

A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão atuar de forma articulada na elaboração de políticas públicas e na execução de ações destinadas a coibir o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante e difundir formas não violentas de educação de crianças e de adolescentes, tendo como principais ações:

I - a promoção de campanhas educativas permanentes para a divulgação do direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos;

II - a integração com os órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, com o Conselho Tutelar, com os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente e com as entidades não governamentais que atuam na promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente (...).

Lei 13.010 de 26/06/2014, artigo 70 A.

Essa lei da Palmada foi iniciativa de um deputado, o poder legislativo elaborou essa lei e ela foi sancionada, jogada para ser cumprida, façam dela o que vocês podem fazer, dentro dos limites dela. Cada um tem que cumprir com a sua responsabilidade. O mais importante desta lei é exatamente a preparação de uma família pra ser família. É o que diz o artigo 70 e, muito pouco ou quase nada foi feito neste sentido.

Por fim, concluindo, são 27 os países que possuem essa Lei da Palmada. A Suécia é a nação que convive com ela a mais tempo. Após um estudo de 2010 sobre o bem estar das crianças, o governo sueco ofereceu aos pais em dificuldades um curso de educação chamado: “Todas as crianças no centro”, sua filosofia, laços sólidos entre pais e filhos são a base de um educação harmoniosa e de indivíduos confiantes e independentes na idade adulta. Ensinar de novo a como conviver na família, pais respeitando os filhos, os filhos respeitando os pais. É o governo que tem que fazer isso.

Essa Lei da Palmada é de 2014, desse ano, mas, já deveria estar implantando esses centros especializados de atendimento. Infelizmente isso não existe. Está claro que não existe uma estrutura para cumprir os artigos desta lei.

Nas minhas considerações finais devo dizer algo mais, que todos os programas, todos os sábados nós temos assistidos a discussão de temas, realmente do maior interesse da coletividade. Mas, eu reputo que o programa de hoje é de extrema importância porque é preciso evitar esse desfiladeiro, impedir que a família continue a cais, descer como estar acontecendo. A desestruturação da família, o seu conceito tradicional está sendo implementado pelo poder público e tudo o mais, quando não haveria necessidade destas coisas todas, desses exageros que hoje vemos.

Eu queria falar também aos cristãos. Eu sei que todos nós, seja qual for a nossa formação religiosa, sabemos que existe alguém que comanda essas coisas todas. Um dos que se dizia mais ateu foi Voltaire e um dia, num navio, numa tempestade em pleno mais se surpreendeu chamando Deus. Ele disse depois que via o mundo como um grande relógio e não admitia esse relógio sem um relojoeiro que cuidasse dele. Então, tem um relojoeiro cuidando desse mundo todo também.

Muita gente tem usado o Velho Testamento, o Livro de Provérbios, principalmente, para alar que o pai, que a família deve disciplinar os filhos. Mas, Jesus veio e se fez justiça por nós. Ele não veio para abolir a lei, pra abolir o Velho Testamento que está lá como um ensinamento pra nós. Jesus pregou o Amor, a Compreensão, a Humanidade e o Desprendimento. É isto que está faltando hoje. Pais e mães mais humildes, mais amorosos, carinhosos e filhos também amorosos e respeitadores. Coloque Amor no seu coração, coloque acima de tudo o Amor, a compreensão, o diálogo. É preciso dialogar, aprender a dialogar dentro de casa e hoje a gente não tem mais tempo pra conversar. A paciência estar por um fio. A casa tem que ser o Porto Seguro, a Enseada calma e tranquila onde ancoram os nossos barcos, as nossas vidas no final de cada dia, por mais tumultuado que tenha sido. Façamos do nosso lar um Santuário de Amor, de carinho, de compreensão e de respeito e não teremos necessidades de punir quem quer que seja. Não vai haver essa necessidade. Lei rigorosa não conserta nada. Temos uma legislação rigorosa e a criminalidade cresce a cada dia, sabe por quê? Porque os homens estão desaprendendo a se respeitar, o Amor está se esfriando no coração dos homens e é por isso que vemos tudo isto acontecer.

Existe uma professora argentina especializada em educação chamada Eugênia Puebla. Ela escreveu algo muito importante:

Mensagem à Família

Na educação de nossos filhos

Todo exagero é negativo.

Responda-lhe, não o instrua.

Proteja-o, não o cubra.

Ajude-o, não o substitua.

Abrigue-o, não o esconda.

Ame-o, não o idolatre.

Acompanhe-o, não o leve.

Mostre-lhe o perigo, não o atemorize.

Inclua-o, não o isole.

Alimente suas esperanças, não as descarte.

Não exija que seja o melhor, peça-lhe para ser bom e dê exemplo.

Não o mime em demasia, rodeie-o de amor.

Não o mande estudar, prepare-lhe um clima de estudo.

Não fabrique um castelo para ele, vivam todos com naturalidade.

Não lhe ensine a ser, seja você como quer que ele seja.

Não lhe dedique a vida, vivam todos.

Lembre-se de que seu filho não o escuta, ele o olha.

E, finalmente, quando a gaiola do canário se quebrar, não compre outra...

Ensina-lhe a viver sem portas.

Dr. Odilon Vieira: Nota 10 para o Programa Diário Semanal, realmente está levando informação a todos os rincões do Sul do Pará. Eu percebi amigo ouvinte, tudo converge para o termo “MODERAÇÃO”. Os pais devem, podem corrigir seus filhos, mas, eu percebi aqui o que é este termo, moderação. Se os pais falharem, vamos ser práticos, quem vai corrigir o filho vai ser a polícia.

Dra. Patrícia Montagna (Psicóloga): É a primeira vez que venho aqui. o assunto não se esgotou. O ouvinte ainda, penso eu, deve estar com dúvidas, por exemplo, se eu não posso bater o que eu devo fazer? Tenho a ousadia de dizer, porque não se fazer outro programa pra se discutir maneiras educativas, práticas, pra que a família, como disse a Dra. Alexssandra, como disse poeticamente o Dr. Plínio Pinheiro, chegue às famílias. Agora no intervalo o Dr. Plínio nos disse que ter trazido o Guia da Super Nanny. Então, precisamos de uma nova mesa pra falar de coisas práticas. Quem está em casa precisa às vezes disso, em vez da criminalização ele precisa é dessa prática do Núcleo Familiar, do fortalecimento das famílias. Uma frase pra encerrar: “um país que quer ser grande tem que proteger quem não terminou de crescer”.

Conselheiro Marconi Guimarães (Conselho Tutelar): Eu agradeço pelo espaço, por mais uma vez estar aqui colaborando e deixar aos pais, aos responsáveis por alguma criança, dizer pra vocês, não transfira pra escola, não transfira para o Conselho Tutelar, pra nenhum órgão o que é de direito seu, porque ninguém de fato vai conseguir educar seu filho que não seja no seio familiar. Porém, também não vamos justificar uma ação de violência por qualquer que tenha sido o seu comportamento e muito obrigado pela oportunidade.

Conselheira Maria Neusa (Conselho Tutelar): O Conselho Tutelar é na minha visão um órgão, não só encaminhador, a lei define isso, ou requisitador. Eu trabalho no Conselho Tutelar e me sinto no dever de educar as pessoas e conversamos muito com as famílias sobre isso. Eu encerro com um provérbio chinês:

Se planejar para um ano, plante arroz! Se planejar para 10 anos, plante árvores! Se planejar para uma vida toda, eduque as pessoas!

Dr. José Erickson (Defensor Público): Em nome da Defensoria Pública mais uma vez agradeço o convite. O Programa Diário Semanal prestou mais uma vez grande serviço às comunidades, da Cidade e da Zona Rural, muita gente teve a oportunidade de tirarem muito proveito em relação as suas dúvidas. A fala final aos pais para terem mais moderação e mais amor com os filhos. Aos aplicadores da Lei mais cautela.

Dra. Cláudia Chini (Advogada OAB): A OAB Subseção de Marabá agrade por este programa, foi um momento muito bom, foi o início do deslindar de um tema polêmico. Faço minhas as palavras da nossa psicóloga Dra. Patrícia, para se fazer um outro programa, não apenas para abordar o que seria esse comportamento, quais seriam as atitudes violentas em relação a correção dos filhos, da violência doméstica, a violência familiar como um todo e aproveitar tudo isso pra um novo programa.

Aos pais uma coisa, a educação dos filhos de vocês é prioritariamente de vocês, ao Estado cabe apenas dar a proteção. Não permita que o Estado se intrometa ao ponto de lhes tirar esse direito. Muito obrigada.


 
 
 

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Eduarda Araújo
Blogueira
Eduarda Araújo

Pós graduada em Gestão de Pessoas, atualmente Analista de Recursos de Infração e Blogueira. Executa trabalhos sociais de dança e teatro em instituições religiosas 

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