Agricultura Familiar da Região de Marabá, fique por dentro.
- Adriana Araujo
- 21 de abr. de 2015
- 5 min de leitura

E muito comum escutar, na nossa região, a conversa de que a Agricultura familiar não produz nada, que esse pessoal é apenas um bando de preguiçosos. Esse tipo de afirmação denota uma completa desinformação de como se constituiu a historia dessa agricultura na região e principalmente o desconhecimento total das condições de vida atual dessa agricultura.
Hoje, se contar todos os projetos de assentamentos do Sul e Sudeste do Pará que já passaram de mais de 500 e ainda somar os posseiros, pequenos proprietários, colonos e ribeirinhos pode-se chegar, sem errar, a mais de 100.000 ou seja mais de meio milhão de pessoas; essa quantidade equivale a população de duas “Marabá”. Onde estaria esse povo sem a terra? além disso, essas famílias tem uma casa onde ficar, um lote onde produzir alimento e comunidade onde viver. Não produzem? Mas de onde vem o arroz, a carne , o feijão, o leite e o queijo que eles comem se não é da própria produção deles mesmos? E quem construiu suas próprias casas, estabeleceu suas escolas rurais, suas primeiras estradas?
Nenhuma dessas áreas, fora os lotes da Transamazônica nos anos 70, foi doada: todas essas áreas foram conquistadas pela luta pela terra que custou a vida, nessa região, de mais de 600 pessoas. Os projetos de assentamento são apenas regularização fundiária depois de vários anos de sofrimento e perseguição. Para ter produzir não é suficiente ter segurança á terra precisa também ter certeza de escoar a produção para a cidade onde tem o mercado consumidor. Por isso, junto com a terra é necessário a logística da produção: estrada, transporte, escola, saúde.
Antes de proferir chavão sobre a agricultura familiar regional precisa entender da sua historia.
1. Fases da Agricultura Familiar
Nos últimos 30 anos, a Agricultura Familiar regional passou por várias fases de sistema de produção:
1.1. a fase da resistência.
Dos anos 70 até os anos 80, durante o período da luta pela terra, os Sistemas de Produção-S.P. adotados pelos posseiros se caracterizam pela fase da ocupação: os S.P. são baseados em culturas anuais sem presença de animais pois enquanto não se resolve a segurança na terra, as famílias não podem residir na área portanto as produções agrícolas servem para demarcar a abertura dos lotes, as áreas ocupadas e marcar a presença da ocupação; esses S.P. não permitem ainda a sustentação das famílias!
1.2. a fase da instalação.
A partir dos anos 90, os posseiros passam a ser reconhecidos como legítimos; começam a funcionar os primeiros assentamentos; sendo resolvida a questão fundiária, as famílias podem morar nos lotes; algumas delas passam a ser assentados. É a fase dos S.P de instalação. Os S.P. são definidos pela subsistência da família; as atividades agrícolas entram numa fase de grande diversificação produtiva; foram implantadas grandes roças consorciadas com culturas principais do arroz, feijão, milho e mandioca assim como sitio/pomar a redor das casas, criação de pequenos animais como aves e suínos e ainda aproveitando da colheita e caça extrativista.
1.3. a fase da consolidação.
Passada a fase de instalação, os S.P. se especializam com forte tendência á pecuária: essa estratégia de gestão do lote visando uma melhor remuneração do trabalho além de que a debilidade das infra-estruturas de transporte, de escoamento e comercialização dos produtos destinados á venda não deixam muitas opções de produção devido o isolamento dos lotes, as distancias e custo de frete até os centros de consumo.
2. A Fase atual: estabelecimento da AF.
A Agricultura Familiar da região do Sul/Sudeste do Para está, no inicio do século XXI, numa encruzilhada: nesses últimos 30 anos, essa Agricultura Familiar construiu seus Sistemas de produção a partir de um duplo contexto histórico/físico: a luta pela terra e a “fertilidade” da mata; no período da conquista da terra, os sistemas de produção são limitados por causa da insegurança á terra e, praticamente até hoje, a seqüência dos sistemas de produção praticados foram possíveis por causa da fertilidade deixada pela derruba da mata nativa; alem disso, a rotatividade das culturas permitida nas capoeiras foi rompida pela implantação dos pastos no lugar das capoeiras. A encruzilhada da Agricultura Familiar está criada: como valorizar a segurança a terra agora mais definida pela formação dos assentamentos e, por outro lado, quais são os sistemas de produção que podem ser estabelecidos sem a “fertilidade” estocada pela mata nativa. Três fatores podem ser feitas como trunfos para escolha de sistema de produção promissores:
A Observação:
A simples observação da floresta amazônica deixa dúvidas a respeito da fertilidade dos seus solos; a exuberância e a biodiversidade das matas nativas remetem a questão da fertilidade para que? A milenária adaptação das plantas nativas aos recursos naturais não permitem de afirmar que o solo é fraco para essas plantas; a questão aparece quando o homem quer implantar nesses solos plantas “exóticas” necessárias para seu alimento.
A autofagia equatorial:
A planta amazônica perfeitamente adaptada a seu meio “inventou” um ciclo de vida próprio: é a planta comendo a planta! Essa autofagia das plantas amazônicas só é possível porque o clima quente e úmido equatorial permite uma renovação rápida da biomassa e da decomposição natural da camada orgânica dos solos; é uma fábrica perpetua de compostagem. A biodiversidade das plantas produz todos os elementos necessários para seu próprio crescimento e o das plantas vizinhas.
A natura da Agricultura Familiar: consórcios, rotações culturais, bodiversidade.
A Agricultura Familiar está numa encruzilhada para determinar quais são os sistemas de produção que as famílias vão implantar para seu sustento; imitar o latifúndio ou o agronegócio as levará a seu fracasso e sua não reprodução social: imitar a mata é o rumo de o caminho a seguir? A Agricultura Camponesa tem potencial para trilhar nessa estrada: plantas associadas e consorciadas, sistemas de cultura em rodízio, plantio direto, técnicas da abafada são algumas práticas que devem ser registradas, adaptadas, melhoradas. Cabe também um grande esforço da pesquisa e da ATER para revelar, registrar, divulgar essas práticas e principalmente ter capacidade de discutir, provocar e negociar propostas e práticas com os Agricultores Camponeses.
Pressupostos da Agricultura Familiar
Os sistemas de produção praticados pelas famílias agrícolas são produtos de uma gestão dos recursos, determinada por vários fatores: tamanho do lote, reserva da mata nativa e/ou da capoeira, distância e acesso aos centros urbanos, circuitos de comercialização, força de trabalho familiar disponível, acumulo de experiência agrícola, etc... Alem desses fatores, ressaltam-se outros fatores que podem influenciar o desempenho da produção do estabelecimento familiar: organização da comunidade, sua participação nas decisões e atividades coletivas, sua coesão social. Esses fatores podem ser limitantes ou potenciais para propor atividades que possam melhorar a renda e a qualidade de vida familiar.
Qualquer proposta de atividades novas deverá considerar cada um desses fatores e deverá ser implementada através de um processo de discussão e análise junto com os assentados envolvidos pois carrega em si exigências suplementares de trabalho, de investimentos, de gestão dos recursos naturais, de informação e capacitação, de organização e comercialização da produção. Só serão possíveis e duráveis ações e atividades suficientemente negociadas e apropriadas pelos assentados.
Não precisa ser doutor em gestão e produtividade do trabalho para saber que ninguém vai trabalhar se não tem certeza de ter um retorno financeiro. Da mesma coisa, o agricultor não vai produzir se não tem certeza de vender; como produzir alface, couve, açaí ou acerola, carneiros ou porcos se não tem por onde escoar a produção na hora de vender? Como ficar numa comunidade se não tiver acesso á escola, á saúde para meus filhos?
É culpa de quem, se numa área isolada o agricultor vai produzir a única produção que anda sozinha na hora da venda é o bovino exigente em pasto portanto exigente em espaço portanto exigente em derrubada?
Para mudar esse círculo vicioso, precisa de logística de escoamento rápido de produtos da roça porque raros são os alimentos que tem longos prazos de validade?
E logística só depende de decisões políticas!!!!! Quem???????
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